Newsletter Destino COP30

Mario Monzoni, coordenador do Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV EAESP (FGVces) por 20 anos, acompanha os desafios de sustentabilidade nas empresas desde que esse tema “era deserto”. Em entrevista exclusiva à newsletter Destino COP30, o doutor em Administração Pública, com dois mestrados (em Administração de Política Econômica e em Finanças Públicas), ressalta que o debate sobre o tema teve grande evolução, mas sinaliza que os desafios, ao mesmo tempo, não param de crescer. 

"Vamos ter que descarbonizar muito (a economia) em pouco tempo. É o que vai acontecer. A gente também, talvez, admita que vai conviver com mais de dois graus de aumento médio (da temperatura do planeta em relação ao período pré-industrial). Pode ser uma escolha da humanidade", afirma.

Para fazer frente a esse cenário, Monzoni aponta a necessidade de combinar instrumentos, políticas públicas e mudanças estruturais, assim como uma maior ambição dos países em aumentar as suas metas.

Leia a entrevista!


1. Qual a sua avaliação do cenário atual sobre o debate e conhecimento da sustentabilidade na sociedade? 

 A boa notícia é que é incrível como o tema cresceu. Não só sobre o clima, mas o olhar para a sustentabilidade, em particular do setor empresarial. Para quem estava aqui 25, 30 anos atrás, que era deserto, fica mais fácil de enxergar. As pessoas conversam e falam sobre isso.  Mas, acho que as boas notícias param por aí. O cenário é bastante preocupante, porque as questões do (da mudança do) clima estão colocadas e seguem em frente, independentemente dos impactos causados para a humanidade.  

2. Isso quer dizer que, apesar dos avanços, estamos longe das soluções que podem reduzir os impactos das mudanças climáticas? 

As regras dos sistemas ambientais são muito mais poderosas do que qualquer outra no planeta. São elas é que mandam. Na minha casa, minhas regras. É o que o meio ambiente está dizendo, embora os seres humanos não tenham entendido isso. 

Vamos ter que descarbonizar muito (a economia) em pouco tempo. É o que vai acontecer. A gente também, talvez, admita que vai conviver com mais de dois graus de aumento médio (da temperatura do planeta em relação ao período pré-industrial). Pode ser uma escolha da humanidade. 

Olhando para trás, as lições de casa não foram feitas. Na COP30 será iniciada uma avaliação do Acordo de Paris. Vamos olhar para trás e ver quanto andamos e discutir o que faremos um pouco mais para frente, tanto em termos de como financiar essa transição, quanto em termos de reavaliar as nossas ambições. São poucos os países que já apresentaram esses novos compromissos (as novas Contribuições Nacionalmente Determinadas – NDC – sigla em inglês).  A gente não tem cumprido o que tem prometido. Isso faz com que a gente vá comendo o orçamento de carbono. Significa que, se a ciência tem razão, a nossa descida, a declividade da curva descarbonização vai ser muito drástica. 

3. Diante disto, qual é o desafio que enfrentamos na COP30? 

Juntar o dinheiro para fazer essa transição (na velocidade necessária). Os países em desenvolvimento estão falando em US$ 1,3 trilhão. Do que está na mesa hoje, falta US$ 1 trilhão e mesmo assim não temos certeza dos US$ 300 bilhões. 

Colocar dinheiro em cima da mesa sempre foi uma questão, em particular para os países desenvolvidos. Essa disputa eu vejo desde que me conheço por gente. Além dos recursos financeiros, a transferência de tecnologia, por exemplo, também é um capítulo que precisa ser discutido. O problema é que não sabemos se vai avançar, ainda mais no contexto global em que estamos.  Seja político, seja de pontos de vista de relações internacionais. O multilateralismo está em xeque e do ponto de vista de convenções ambientais, a mesma coisa pode acontecer. 

4. E temos o desafio das NDCs... 

Talvez, este seja o ponto o mais importante. O que temos hoje em termos de NDC não daria conta nem do Acordo de Paris. Se juntarmos todas as NDCs em cima da mesa, a gente não tem, não consegue reduzir as emissões no grau necessário. É o que a gente chama de Emissions Gap e o tempo diminuiu. Então, precisa chamar todo mundo e dizer: “olha, manda um plano novo com ambições maiores, porque o que estava em cima da mesa, e a gente não cumpriu, já não dá mais”. 

Então, a gente tem que aumentar a meta sem ter cumprido o mínimo que era o que estava comprometido antes. É uma agenda desafiadora. 

5. O senhor acredita que o mercado de carbono será suficiente para resolver o problema das emissões no Brasil?

O mercado de carbono pode ser um instrumento importante, mas está longe de ser a solução completa. No caso do Brasil, a maior parte das emissões vem do uso da terra e da agropecuária, áreas que, até agora, estão fora da regulação. O que está sendo regulado são as emissões da indústria, que representam uma fração menor. Mesmo que o mercado funcione perfeitamente, fazendo uma conta rápida, ele deve impactar apenas cerca de 3% das emissões totais do país. Ou seja, ele ajuda, mas está longe de resolver o problema. Vamos precisar de uma combinação de instrumentos, políticas públicas e mudanças estruturais.


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