

Ampliar o diálogo entre empresas e lideranças da COP30, colaborando para garantir que o setor privado consiga apresentar suas perspectivas e contribuir de forma estratégica para avançar uma transição energética justa, eficaz e economicamente viável. Esse é o foco da atuação da enviada especial da COP30 para o setor empresarial e presidente do CEBDS, a economista Marina Grossi, que conversou com a Destino COP30 com exclusividade.
“No coração da Amazônia, a COP30 tem o poder simbólico e prático de mostrar ao mundo o protagonismo do Brasil na construção de soluções integradas para clima, natureza e pessoas. A presença ativa do setor empresarial é essencial para que as negociações se traduzam em compromissos viáveis e ações concretas”, diz.
Confira o bate-papo exclusivo na íntegra!
1. A senhora foi nomeada enviada especial da COP30 como representante do setor empresarial. Em reunião com os demais enviados e lideranças da conferência, destacou como um dos seus principais objetivos “promover diálogos efetivos para a colaboração público-privada, superando barreiras e conectando planos de transição corporativos com prioridades nacionais.” Em sua avaliação, quais são hoje os principais obstáculos para essa ação conjunta entre os setores público e privado?
Ainda existem desafios importantes para uma atuação mais coordenada entre os setores público e privado e o principal talvez seja a dificuldade de traduzir metas e compromissos nacionais em caminhos práticos e viáveis para os diferentes setores da economia.
Muitas vezes, o setor produtivo tem planos robustos de transição climática, mas faltam sinalizações claras, marcos regulatórios atualizados ou incentivos que viabilizem a escala dessas soluções.
Por isso, é fundamental promover espaços de escuta e construção conjunta. A colaboração entre governo, empresas e sociedade civil é o único caminho possível para avançarmos em uma transição que seja ao mesmo tempo justa, eficaz e economicamente viável.
Temos atuado para fortalecer essa colaboração, apoiando a construção de políticas públicas e promovendo iniciativas como a Coalizão para a Descarbonização dos Transportes, liderada pelo CEBDS, a Motiva, a Confederação Nacional do Transporte (CNT) e o Observatório Nacional de Mobilidade Sustentável do Insper. A Coalizão nasceu a partir de um pedido do presidente da COP30, o embaixador André Corrêa do Lago, e reúne mais de 50 organizações, entre empresas, entidades setoriais e academia. Como resultado desse trabalho conjunto, produzimos um plano que propõe uma série de medidas para reduzir em até 70% as emissões setoriais de gases de efeito estufa previstas para 2050 e atrair mais de R$ 600 bilhões em investimentos verdes ao Brasil.
Como Enviada Especial da COP30 para o setor empresarial, tenho o papel de ampliar o diálogo entre as empresas e a liderança da COP30, ajudando a garantir que as perspectivas do setor empresarial estejam visíveis e representadas. Além disso, preciso mobilizar contribuições do setor privado para apoiar alguns resultados prioritários e estratégicos da Agenda de Ação, em áreas como agricultura regenerativa, economia circular e mercados de carbono.
2. Nos últimos anos, a pauta da sustentabilidade tem enfrentado questionamentos por diferentes atores — tanto políticos quanto empresariais, em diversas partes do mundo. Esse cenário tem enfraquecido os compromissos assumidos por empresas rumo à descarbonização das cadeias de valor, tanto nacionais quanto globais?
Esse movimento de contestação à agenda ESG é, muitas vezes, influenciado por visões polarizadas ou por percepções equivocadas de que sustentabilidade representa uma agenda restritiva. Mas essa é uma visão que tende a perder força diante da realidade dos negócios.
A sustentabilidade já é parte do planejamento estratégico de muitas empresas — não apenas por convicção, mas por necessidade competitiva. É uma resposta a riscos concretos, a exigências de mercado e à expectativa crescente de investidores, consumidores e da sociedade.
No Brasil, temos buscado um caminho de pragmatismo: mostrar que alinhar ambição climática com desenvolvimento econômico é possível e desejável. Avanços como a regulamentação do mercado de carbono, por exemplo, são alavancas para atrair investimentos, promover inovação e gerar empregos.
3. Os eventos climáticos extremos têm se tornado um fator de risco crescente para os negócios em diversos setores. Essa realidade já está no centro das decisões de investimento e estratégia das empresas brasileiras?
Essa percepção já está consolidada entre muitas empresas, mas ainda há muito a avançar, sem dúvidas. Os eventos extremos que estamos presenciando — como a tragédia climática no Rio Grande do Sul, no ano passado — deixam claro que os riscos climáticos não são futuros, são presentes.
Eles afetam cadeias de suprimento, infraestrutura, trabalhadores, clientes e comunidades inteiras. E têm impactos diretos nas decisões de investimento.
As empresas estão cada vez mais incorporando cenários climáticos nas suas análises de risco, adaptando estratégias e buscando soluções que sejam ao mesmo tempo resilientes e regenerativas. O Brasil tem muito a contribuir nesse debate, especialmente com soluções baseadas na natureza e inovação em setores-chave como energia, agropecuária e transporte.
4. Políticas públicas brasileiras voltadas à descarbonização da economia, como a recém-aprovada Lei do Combustível do Futuro, são, na sua visão, suficientes para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e permitir que o país cumpra sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC)?
A aprovação da Lei do Combustível do Futuro representa um passo importante na consolidação de um modelo brasileiro de descarbonização, especialmente no setor de transportes. Ao fomentar o uso de biocombustíveis avançados, como o SAF, o biometano e o diesel verde, a nova legislação fortalece uma agenda na qual o Brasil já possui reconhecida liderança. Trata-se de uma sinalização positiva ao mercado e uma oportunidade para ampliar a competitividade de soluções sustentáveis compatíveis com a infraestrutura existente. Mas, para cumprirmos a nossa NDC, precisamos de uma combinação ampla de políticas — integrando descarbonização, proteção da biodiversidade, bioeconomia e justiça social.
O setor empresarial tem contribuído diretamente com a construção e implementação de diversas políticas públicas voltadas para o desenvolvimento sustentável, como a regulamentação do mercado de carbono, a Taxonomia Sustentável Brasileira, a Estratégia Nacional de Bioeconomia, a Estratégia e Plano de Ação Nacionais para Biodiversidade (Epanb) e a Política Nacional de Fomento à Agricultura Regenerativa.
5. Qual é, na sua opinião, a importância da participação ativa das lideranças empresariais brasileiras na COP30, especialmente considerando que o evento acontece na Amazônia e busca promover avanços significativos no financiamento para mitigação e adaptação às mudanças climáticas?
A COP30 é uma oportunidade histórica. Sediada no coração da Amazônia, ela tem o poder simbólico e prático de mostrar ao mundo o protagonismo do Brasil na construção de soluções integradas para clima, natureza e pessoas.
A presença ativa do setor empresarial é essencial para que as negociações se traduzam em compromissos viáveis e ações concretas. As empresas são parte da solução: têm capacidade de mobilizar investimentos, inovar e escalar transformações.
Para que isso aconteça, o engajamento da alta liderança é decisivo, pois são os executivos e conselheiros que podem dar a direção estratégica necessária para que as empresas incorporem a sustentabilidade em seus modelos de negócio.
No CEBDS, temos trabalhado ativamente para fomentar esse protagonismo, por meio de iniciativas como o nosso Conselho de Líderes, formado majoritariamente por CEOs das empresas associadas, e que tem um papel fundamental no diálogo entre o setor empresarial, o Poder Público e a sociedade civil. Temos ainda uma série de ações em parceria com atores globais como o World Business Council for Sustainable Development (WBCSD), do qual somos o braço brasileiro, e a We Mean Business Coalition (WMBC), para engajar lideranças empresariais não só do Brasil, mas de todo o mundo. Um exemplo de iniciativa global é o nosso COP30 CEO Action Advisory Board, com 50% de CEOs nacionais e 50%, internacionais, que têm buscado construir soluções para colaborar com o sucesso da COP30 e a construção de um legado do evento.
O que propomos é um pacto de colaboração — entre setor privado, governos e sociedade — para destravar o financiamento climático, apoiar cadeias produtivas sustentáveis e impulsionar o desenvolvimento de baixo carbono com inclusão social.
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